quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Manifesto dos juristas pela soltura imediata de *Cesare Battisti*

25 JANEIRO 2011 (BR)
*Manifesto pelo fim imediato da prisão insustentável e inconstitucional de

Cesare Battisti*



Os cidadãos abaixo assinados expressam total inconformidade com a decisão do

ministro Cézar Peluso, presidente do Supremo Tribunal Federal, de manter

preso o cidadão italiano Cesare Battisti e instam pela sua soltura imediata

e inadiável, por ser de justiça. A situação atual constitui profundo

desprezo *a) *à decisão do presidente da república pela não-extradição, *b)

*ao estado democrático de direito e, sobretudo, *c) *à dignidade da pessoa

humana. Imprescindível, portanto, virmos a público manifestar:


*1.* No dia 31 de dezembro de 2010, o presidente da república decidiu negar

o pedido de extradição de Cesare Battisti, formulado pela Itália. A

legalidade e legitimidade dessa decisão são inatacáveis. O presidente

exerceu as suas competências constitucionais como chefe de estado. A

fundamentação contemplou disposições do tratado assinado por Brasil e

Itália, em especial o seu Art. 3º, alínea *f*, que obsta a extradição para

quem possa ter a situação agravada se devolvido ao país suplicante, por

“motivo de raça, religião, sexo, nacionalidade, língua, opinião política,

condição social ou pessoal”.


*2. *O presidente da república assumiu como razões de decidir o detalhado e

consistente parecer da Advocacia-Geral da União, de n.º AGU/AG-17/2010. A

decisão do presidente também condiz com os sólidos argumentos de cartas

públicas e manifestos firmemente contrários à extradição, assinados por

juristas do quilate de Dalmo de Abreu Dallari, Bandeira de Mello, Nilo

Batista, José Afonso da Silva, Paulo Bonavides e Juarez Tavares, entre

outros. A decisão também confirmou o refúgio concedido a Cesare Battisti

pelo governo brasileiro, em janeiro de 2009, pelo então ministro da justiça

Tarso Genro, que da mesma forma admitira o status de perseguido político

dele.


*3. *Vale lembrar que o STF, em acórdão de dezembro de 2009, confirmado em

abril de 2010, reafirmou (por cinco votos contra quatro) que a palavra final

no processo de extradição cabe exclusivamente ao presidente da república – o

que já constituía praxe na tradição constitucional brasileira e no direito

comparado. Na ocasião, o ministro Marco Aurélio de Mello (um dos votos

vencidos) fez uma observação cristalina: o extraditando está preso enquanto

se decide sobre sua extradição.


*4. *Em conseqüência, Cesare Battisti permaneceu preso aguardando o

posicionamento do presidente da república. Nesse ínterim, o governo italiano

encabeçado pelo primeiro-ministro Silvio Berlusconi utilizou de intimidações

jactantes e declarações despeitadas para pressionar as autoridades

brasileiras e fazer de Battisti uma espécie de espetáculo circense, para

salvar o seu governo da crise interna que notoriamente atravessa.


*5. *Causou perplexidade e repúdio, portanto, quando, tendo conhecimento da

decisão do presidente da república, o ministro Cézar Peluso, presidente do

STF, negou a soltura de Cesare Battisti. O Art. 93, inciso XII, da

Constituição determina que “a atividade jurisdicional será ininterrupta” e o

faz, precisamente, para contemplar casos de emergência, em que direitos

fundamentais estejam ameaçados. Ora, o magistrado investido da jurisdição

dispunha, em 6 de janeiro, de todos os elementos factuais e jurídicos para

decidir sobre o caso. Porém, resolveu não agir, diferindo a decisão para

(pelo menos) fevereiro, determinando nova apreciação pelo plenário da corte.

Tal adiamento serviu a novas manobras dos interessados na caça destemperada

a Battisti, num assunto que, de direito, já foi decidido pela última

instância: o presidente da república.


*6. *A decisão em sede monocrática do ministro Cézar Peluso afronta

acintosamente o conteúdo do ato competente do presidente da república. Se,

como pretende o presidente do STF, o plenário reapreciará a matéria, isto

significa que o presidente da república não deu a palavra final. Ou seja, o

ministro Cézar Peluso descumpriu não somente a decisão definitiva do Poder

Executivo, como também os acórdãos de seu tribunal, esvaziando-os de

eficácia. Em outras palavras, um único juiz, voto vencido nos acórdões em

pauta, desafiou tanto o Poder Executivo quanto o Poder Judiciário. O

presidente do STF não pode transformar a sua posição pessoal em posição do

tribunal. Não lhe pode usurpar a autoridade, já exercida quando o plenário

ratificara a competência presidencial sobre a extradição.


*7. *A continuidade da prisão de Cesare Battisti tornou-se uma abominação

jurídica. Negada a extradição, a privação da liberdade do cidadão ficou

absolutamente sem fundamento. A liberdade é regra e não exceção. A

autoridade judicial deve decretar a soltura, de ofício e imediatamente, como

prescreve o Art. 5º, inciso LXI, da Constituição. Cesare está recluso no

presídio da Papuda, em Brasília, desde 2007. Mantê-lo encarcerado sem

fundamento, depois de todo o rosário processual a que foi submetido nos

últimos três anos, com sua carga de pressão psicológica, consiste em extremo

desprezo de seus direitos fundamentais. Significa ser cúmplice com uma

prisão arbitrária e injustificada, absolutamente vergonhosa para o país, em

indefensável violação ao Art. IX da Declaração Universal dos Direitos

Humanos de 1948, dentre inúmeros tratados e documentos internacionais de que

o Brasil é signatário.


Manifestamos a total inconformidade diante da manutenção da prisão de Cesare

Battisti, mal escorada numa sucessão incoerente de argumentos e decisões

judiciais, que culminou no ato ilegal e inconstitucional do ministro Cézar

Peluso, ao retornar o caso mais uma vez ao plenário do STF.

Por todo o exposto, reclamamos pela liberdade imediata de Cesare Battisti,

fazendo valer a decisão competente do presidente da república em 31 de

dezembro de 2010.

Rio de Janeiro, 14 de Janeiro de 2011.



*Assinam:*


1) Marcelo D. Torelly - Professor do Curso de Direito da Universidade
Católica de Brasília
2) Jose Ribas Vieira, professor do PPGD da UFRJ e UFF
3) Nilo Batista – Advogado e Professor da Universidade Estadual do Rio de
Janeiro
4) Carlos Bruno Ferreira da Silva - Procurador da República no estado do
Espírito Santo
5) Alexandre Fabiano Mendes – Defensor Público do Estado do Rio de Janeiro
6) José Carlos Moreira da Silva Filho - Professor no Programa de
Pós-Graduação em Ciências Criminais da PUC-RS
7) Eduardo Rabenhorst Diretor e Professor do Centro de Ciências Jurídicas da
UFPB
8) Juvelino Strozake - Advogado
9) Francisco de Guimaraens – Jurista Professor Universitário
10) Gisele Cittadino – Jurista Professora universitária
11) Fábio Carvalho Leite – Jurista Professor universitário
12) Gustavo Sénéchal de Gofredo – Jurista Professor universitário
13) Ronaldo Cramer - Advogado
14) Mauro Abdon - Advogado
15) Marcello Oliveira - Advogado
16) Alexandre Freitas de Albuquerque - Advogado
17) Vanessa Santos do Canto - Advogada; professora UNIRIO.
18) André Barros - Advogado - Rio de Janeiro

19) Alberto Schprejer - Editor - Rio de Janeiro

20) Christine Rondon Teixeira

21) André Luiz Machado (Juiz do Trabalho do TRT da 6ª Região)

22) CAROL PRONER, coordenadora do mestrado em Direitos Fundamentais e

Democracia (UNIBRASIL-Curitiba) e co-diretora do master-doutorado em

Derechos Humanos (Universidad Pablo de Olavide - SEVILLA)

23) WILSON RAMOS FILHO, professor de direito na UFPR e no master-doutorado

em Derechos Humanos, Interculturalidade y Desarollo (Universidad Pablo de

Olavide - SEVILLA).

24) Naiane Pancinha Godolphim

26) Deisy Ventura – Professora de Direito Internacional do IRI/USP

27) M. Fernanda M. Seibel – advogada (RS)

28) ) Giane Alvares Ambrósio Alvares, advogada, SP, RG 22595159-9

29 ) Fabricio toledo de souza, advogado,

30) Wadih Damous – advogado – Presidente OAB/RJ

31) Adriana Vidal - professora universitária

32) Alexandre Mendes - professor universitário - UFRRJ
 
Grupo Brasil e Desenvolvimento
http://www.brasiledesenvolvimento.wordpress.com/

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Eleições de juízes na Bolíva

Na Bolívia, juiz constitucional é escolhido pelo povo

Por Ludmila Santos

A Bolívia se prepara para instituir eleições nacionais inéditas no país.
Entre junho e setembro deste ano, juízes de todos os Tribunais de Justiça e
da Corte Constitucional serão escolhidos diretamente pelo voto popular. A
medida foi possível graças à revisão na Constituição boliviana, reformulada
com a eleição do presidente Evo Morales. A intenção é que a designação dos
magistrados fique sob controle da cidadania, com o objetivo de garantir a
independência política na hora da escolha dos juízes, de acordo com o
presidente do Tribunal Constitucional da Bolívia, Juan Lanchipa Ponce.

"A população quer a absoluta independência nas cortes e se ver representada

de maneira efetiva, inclusive na esfera judicial", afirmou Ponce, que falou
sobre a novidade na II Conferência Mundial de Cortes Constitucionais,
realizada no Rio de Janeiro. A nova Constituição, segundo o ministro,
representa a reação popular aos anos de opressão política e social no país,
marcado por conflitos com países vizinhos e tensões internas.
De acordo com o artigo 199 da nova Constituição da Bolívia, estão
qualificados para compor o Tribunal Constitucional pessoas com 35 anos ou
mais e que tenham conhecimento especializado ou experiência comprovada de
pelo menos oito anos nas disciplinas de Direito Constitucional e
Administrativo e de Direitos Humanos. Os candidatos serão propostos por
organizações da sociedade civil, inclusive as indígenas e camponesas, e
pré-selecionados pelo Congresso. A lista será submetida a votação popular.
A novidade jurídica boliviana vem acompanhada de uma invenção política:
eleições sem propaganda. Para garantir a isenção política do pleito, o
porta-voz do Tribunal Constitucional, Ernesto Félix Mur, explicou que os
candidatos, e terceiros, estarão proibidos de fazer propaganda direta ou
indireta: "Apenas o tribunal poderá difundir os méritos de cada candidato".
O Tribunal Eleitoral ficará responsável pela organização das eleições de
juízes.
A Corte Constitucional será composta pelos sete mais votados. Garantido o
preenchimento das cotas para as mulheres (três vagas), e para indígenas ou
camponeses (duas vagas) restam duas vagas para a livre escolha de toda a
sociedade. Os que ficarem entre as posições 8ª e 14ª serão os suplentes. Os
sete que vierem em seguida serão os suplentes dos suplentes. Os juízes
ficarão no cargo por seis anos, sem direito a reeleição. A nova Constituição
foi aprovada em referendo constituinte em 6 de fevereiro de 2009.

 
"Vivemos um momento histórico muito importante, com uma Constituição
plurinacional, que prioriza a proteção coletiva, sem suprimir a proteção
individual", afirmou Félix Mur. A expectativa é que a posse dos novos
membros aconteça em outubro deste ano.

Opiniões contrárias

O novo sistema de designação de juízes é visto como um passo transcendental
por Félix Mur, pois prevê a representação da parcela indígena e camponesa da
população e vai garantir a independência do magistrado, já que não será
indicado por político, seja o presidente ou parlamentares. No entanto, a
medida é vista com ressalvas por outros juízes constitucionais.

 
O presidente do Tribunal Constitucional de Portugal, Rui Manuel Gens de
Moura Ramos (na foto ao lado), não é favorável à escolha do juiz
constitucional por voto popular, por se tratar de uma posição técnica.
"Entendo que o juiz deve preencher uma série de qualificações técnicas para
desempenhar as funções na Corte Constitucional. A via democrática não pode
ser usada para justificar a independência do juiz, pois a eleição envolve
questões políticas. E o juiz não pode depender do poder político", destacou.
Em Portugal, dez membros da corte são escolhidos pelo parlamento e três
pelos juízes do Tribunal Constitucional. O mandato é de nove anos, como
contou em entrevista concedida à ConJur e publicada no último domingo
(16/1).

O presidente da corte portuguesa foi gentil e preferiu relativizar suas
restrições à iniciativa boliviana: "Podemos observar que a adoção dos
critérios de designação de juízes, e a forma como eles exercem suas funções,
é ditada em cada país pelos caminhos históricos e culturais trilhados por
ele". Moura Ramos destacou ainda que apenas quando os juízes assumirem a
independência como valor é que as pessoas vão entender o seu papel na corte.
O excesso de democratização dos tribunais constitucionais pode representar
uma ingerência política na corte, de acordo com o vice-presidente da Corte
Constitucional do Equador, Edgar Zárate. Ele afirmou que os procedimentos
para escolha do juiz constitucional devem ser determinados pelos
dispositivos de legitimidade da Constituição do país. "A discussão
democrática é sempre positiva, mas, nesse caso, o povo nem sempre tem
conhecimento dos preceitos constitucionais. Ele vai fazer sua escolha de
acordo com a propaganda dos candidatos, pela simpatia. Acho que dessa
maneira se perdem muitas oportunidades de se escolher alguém que vá
respeitar os direitos constitucionais. Há ainda a possibilidade da corte
ficar politizada, o que esbarra em sua autonomia, em sua isenção."

Zárate explicou que, no Equador, os juízes constitucionais são escolhidos
por meio de concurso de mérito. O processo se inicia com a escolha dos
candidatos por dois delegados do Poder Executivo, dois do Legislativo e dois
de associações de controle social. Cada um deles escolhe nove candidatos. Os
27 indicados passam então por um concurso de mérito, do qual serão
selecionados nove. Eles permanecem no cargo por 12 anos.

 
As regras foram estabelecidas com a entrada em vigor da nova Constituição do
Equador, em 20 de outubro de 2008. A carta também estabeleceu a mudança da
Corte Suprema de Justiça para Corte Constitucional, que, além de assegurar
os direitos constitucionais, permite a revisão de sentenças da Justiça
ordinária.

Para a ministra Marisol Peña Torres, do Tribunal Constitucional do Chile, na
hipótese de o juiz ser eleito popularmente, ele pode se comprometer com o
setor político que o levou ao cargo. "O juiz constitucional deve obedecer
somente à Constituição. Não deve estar atrelado a poder nenhum." Ela
destacou que, com a reforma constitucional em 2005, a Carta Magna do Chile
garantiu a autonomia do Tribunal Constitucional, independente dos outros
poderes. Além disso, segundo Marisol, os juízes são regidos pelo "dever de
ingratidão", ou seja, ao decidir, não podem considerar os interesses
daqueles que lhes indicaram. "Esta é uma das formas de garantir a
independência da corte dos outros órgãos."

A corte chilena é composta por três membros indicados pelo presidente da
República, três indicados pela Corte Suprema, dois pelo Senado e dois pela
Câmara dos Deputados, com ratificação do Senado. Eles devem ter 15 anos de
exercício profissional, podendo ter se destacado em atividade pública ou
acadêmica. "O tribunal pode ser composto, por exemplo, por um
ex-parlamentar, um advogado de grande prestígio ou mesmo por um acadêmico."
 
De Jose Luiz Quadros de Magalhães