domingo, 5 de junho de 2011

Esclarecimento sobre os protesto em Vitória - ES

Melhor que nada
sábado, 4 de junho de 2011 - Esclarecimentos sobre os recentes protestos em Vitória, Espírito Santo

Por Matheus Boni Bittencourt
Não posso falar em nome de todos os manifestantes, pois, em uma ação coletiva massiva, é impossível que não existam divergências entre os participantes. Posso, no entanto, falar daquilo que vivenciei, com o que amigos e camaradas vivenciaram, e confrontar com aquilo que a mídia capixaba vem divulgando. O jornal A Tribuna publicou a manchete, "Baderna complica a vida de mais de um milhão"; já A Gazeta anunciou que "Eles querem passe livre... mas não deixam a cidade passar"; o Notícia Agora anunciou, mais simplesmente: "Sem controle". Nos subtítulos das manchetes, acusavam o movimento estudantil de paralisar a cidade (ou apenas o trânsito), depredar o patrimônio público e provocar o "caos" e o "confronto" com a polícia. Sobre o objetivo do movimento, os jornais apenas falavam de "passe-livre", ou seja, acusavam os estudantes de lutarem para andar de graça nos ônibus. Falavam, também, da prisão de "mais de 20" estudantes, o que, além de um dado impreciso, não esclarece qual teria sido o motivo da prisão.

Nada foi dito, porém, à respeito dos objetivos reais do movimento, nem sobre a política do governo estadual para o transporte coletivo, para não falar da descrição tendenciosa do "confronto" entre o Batalhão de Missões Especiais e a cavalaria da Polícia Militar, salpicada de calúnias contra os manifestantes. O objetivo mais imediato do movimento é a redução da passagem de ônibus, que teve um aumento de 15% no início deste ano, por decisão do governador, e demonstrar repúdio contra o uso da polícia militar pelo governo estadual, que, além de reprimir e criminalizar os movimentos sociais despejou com uma crueldade e truculência surpreendente, centenas de famílias de um acentamento precário em que viviam, provocando a morte de uma pessoa e deixando estas famílias sem abrigo, e mesmo sem os seus móveis, pois a polícia não lhes deu tempo sequer para retirar os seus bens de dentro da sua casa.

No protesto desta quinta-feira, 2 de junho de 2011, os estudantes fecharam os dois lados da rua em frente ao Palácio Anchieta, e exigiram, ao longo de horas, que o governo estadual abrisse o diálogo e o atendimento às reivindicações de redução do preço e melhora dos serviços de transporte coletivo. O governador manteve-se intransigente: não dialogou, não negociou e não cedeu um milímetro. Por fim, ordenou que o BME e a cavalaria da polícia militar reprimissem o protesto com balas de borracha, bombas de "efeito moral" e gás lacrimogêneo. Centenas de policiais armados foram mobilizados para atacar dezenas de manifestantes. Em uma reação irrefletida, alguns manifestantes atiraram pedras contra a polícia. Isso, de manhã. Durante a tarde, houve outro protesto, em frente à UFES. Novamente, a atitude do governo foi a repressão. O mais grave, porém, é que os policiais continuaram atirando e perseguindo os manifestantes mesmo depois de dispersá-los. Chegaram a atirar com bombas e balas de borracha dentro da universidade, e prenderam 27 pessoas (entre os quais um vendedor ambulante que casualmente estava no local, e um jornalista que observava o acontecimento), ambas ações ilegais que configuram Abuso de Autoridade. Os presos foram acusados de "desacato à autoridade", e só foram soltos gráças à intervênção de advogados do movimento de direitos humanos. O próprio secretário de segurança apareceu na delegacia, não se sabe com qual propósito. Além das prisões ilegais, vários manifestantes ficaram feridos.

A imprensa governista, é claro, não mostrou o ponto de vista dos manifestantes. Apesar da retórica de falsa neutralidade, típica do jornalismo mercenário, apresentou, claramente, a versão contada pelo governo estadual, manipulando os fatos para tentar atiçar os leitores contra o movimento, apresentado como "baderna", mostrando a repressão como se fosse um "confronto", e escondendo os objetivos do movimento. Poucos exemplos de manipulação midiática à serviço de mentiras oficiais me pareceram tão claros.

No dia seguinte, o movimento ganhou força. Desta vez não foram dezenas, mas no mínimo mil, talvez dois mil, manifestantes que saíram às ruas contra o autoritarismo e a política de transporte do governo estadual e por um transporte público de qualidade e com um preço justo para todos os seus usuários.

De imediato, é necessário reduzir o preço da passagem e obrigar a empresa de ônibus a aumentar a frota. É necessário também acabar com a atitude autoritária do governo em relação aos pobres e aos movimentos sociais. Porém, o problema do transporte coletivo é o mesmo que o de outros serviços públicos (saúde, educação, previdência, etc.): a sua privatização e monopolização, e a associação oculta dos seus proprietários privados a grupos políticos poderosos. O transporte coletivo em todo o Brasil é uma concessão pública a ser explorada por empresas privadas. Por meio de um obscuro jogo de interesses, estes empresários e políticos conseguem socializar os custos necessários aos seus superlucros privados, aumentando o preço, reduzindo a frota, e reprimindo os meios de transporte coletivo alternativos. Como o uso do transporte coletivo vai se tornando dispendioso, em termos de tempo e dinheiro, muitos preferem o carro pessoal, e o resultado é visível nos engarrafamentos constantes, agravados ainda mais pelas obras inacabadas que bloqueiam partes das ruas da cidade. Vitória é uma ilha e já teve um sistema de transporte coletivo marítimo. Por que ele acabou? Por que as vãs que realizavam transporte foram reprimidas de modo tão obsessivo, ao invéz de serem simplesmente regulamentadas? Tudo indica que há uma "máfia do transporte", que associa o monopólio privado aos governo estadual. A única solução seria a desapropriação das empresas privadas de transporte coletivo, e estabelecimento de uma empresa pública estadual com monopólio sobre o serviço de transporte coletivo, tanto urbano quanto marítimo. Algumas pessoas do movimento concordam comigo. É improvável que todos concordem. Porém, creio que esta é a única solução de longo prazo para este problema, solução que não se pode esperar da mafiocracia que governa o Espírito Santo há 9 anos.

Publicado por Matheus Boni Bittencourt

2 comentários:

  1. Olá Jacimar. Vi seu blog na lista do "Terror do Nordeste" e o título do post me chamou a atenção, porque também sou morador da Grande Vitória. Parabéns pelo seu blog, bem elaborado, com argumentação forte.
    Concordo com quase tudo que foi citado em sua postagem, principalmente com o monopólio do transporte e a consequente formação de "máfia". Mas discordo -inclusive fiz uma postagem a respeito- da paralisação do trânsito. Com essa atitude, seja de estudantes ou qualquer outra categoria, quem sempre sai prejudicado é a população em geral, que também passa pelos mesmos problemas dos manifestantes. Creio que deve ser pensado outro meio de protesto, por exemplo a invasão da sede do governo, assembléia legislativa e outros.
    Abraços.
    Abraços.

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  2. Olá! Eliseu, Obrigado. Olha primeiro gostaria de esclarecer que está reportagem é do Matheus Boni Bittencourt. Quanto ao seu questionamento do sobre a forma do protesto, infelizmente, nunca conseguiremos agradar a todos, pois, sempre haverá alguém prejudicado, caso não houvesse, não seria um protesto. Concordo que a população sofre, mas qual é o dia da semana que ela não sofre? ônibus sempre lotado, demora nos pontos, só há uma alternativa de transporte público. Se o problema é o sofrimento, é triste, mas é verdade, isso nós temos todos os dias. Acho que está na hora da popular pensar sobre e se juntar a nós, pois a causa é a mesma.

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